Como no cheque especial os juros cobrados são uns dos mais altos do mercado, decisões do Superior Tribunal de Justiça têm evitado abusos contra clientes que lançam mão desse produto bancário. Muitos bancos, por exemplo, alteram o limite do cheque sem aviso prévio ao correntista. E, mesmo que o cliente seja inadimplente, ele deve ser informado da mudança. O STJ vem, assim, tecendo jurisprudência nesse sentido.
É o caso, por exemplo, do julgamento do Agravo de Instrumento 1.219.280, que envolve o Banco Itaú. A instituição teria cancelado o limite de um de seus correntistas. O banco, por sua vez, afirmou que não houve falha na prestação do serviço, não havendo ilícito. O ministro Massami Uyeda considerou que o banco deveria indenizar o cliente por danos morais.
No entanto, uma das primeiras decisões veio da ministra Nancy Andrighi. No caso, um cliente inadimplente com o ABN Real teve seu limite do cheque especial cancelado. Um dos seus cheques foi devolvido e sua conta foi automaticamente cancelada. Entretanto, o débito não era do próprio correntista, mas relativo a empréstimo do qual ele foi avalista. O cliente resolveu entrar com uma ação contra o Real, pedindo indenização por dano moral. Por outro lado, o banco afirmou que o cheque especial é um prêmio concedido aos clientes que cumprem suas obrigações em dia. No entanto, a ministra Andrighi esclareceu que “não há relação entre o contrato de mútuo avalizado pelo correntista e a abertura de crédito em conta-corrente, cujo limite de crédito foi cancelado, o que impede o cancelamento de um em razão da inadimplência do outro, pois são relações jurídicas distintas”.
Segundo o advogado Rodrigo Daniel dos Santos, consultor jurídico do Instituto de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec) e especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas, esse é um dos problemas mais comuns das instituições bancárias. “Cancelar ou diminuir o limite do cheque especial, sem aviso prévio, pode ser considerado uma quebra de contrato”, observou.
Retenção de salários
Também é um abuso cometido pelos bancos a retenção de salários para a quitação do cheque especial. A penhora de salários e vencimentos necessários à manutenção do devedor e de sua família é vedada pelo artigo 649 do Código de Processo Civil. O entendimento foi empregado pelo ministro Humberto Gomes de Barros no julgamento do Recurso Especial 507.044.
O processo envolve o Branco do Brasil. De acordo com a instituição, a retenção de salário é admitida sob a alegação de exercício do direito de executar o contrato. Entretanto, para o ministro, mesmo com permissão de cláusula contratual, a apropriação de salário para quitar cheque especial é ilegal e dá margem à reparação por dano moral.
Excesso na fixação de taxas
Algumas decisões do STJ vem combatendo também os excessos na fixação de taxas de juro. No Recuso Especial impetrado pela Losango Promotora de Vendas Ltda. e HSBC Bank Brasil S.A., um correntista pedia a retificação de taxa de contrato fixada em 380,78% ao ano.
O relator do recurso, então ministro Pádua Ribeiro, já aposentado, afirmou que, apesar de não ser possível considerar abusivas taxas acima de 12% ao ano, na hipótese analisada o valor seria excessivo. A média de mercado no mês em que o que o empréstimo foi concedido era de 67,81%.
Para o consultor Rodrigo Daniel dos Santos, do Ibedec, o problema está na falta de objetividade dos contratos para cheques especiais. Eles são demasiadamente genéricos e não especificam as taxas que variam acima do mercado e que, para provar que as taxas de mercado são excessivas, deve haver perícia ainda nas instâncias inferiores.
De acordo com o advogado, o STJ vem entendendo ser possível a capitalização em cédulas de crédito bancário, como o cheque especial. A prática é permitida pela Medida Provisória 2.170/2001 e pela Lei 10.931/2004, que estão sendo contestadas no Supremo Tribunal Federal pela Ação Declaratória de Inconstitucionalidade 2.136.
Aplicação do CDC
Os bancos ainda resistem à aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Como explica o presidente da Associação Nacional de Defesa dos Consumidores do Sistema Financeiro (Andif), o advogado Aparecido Donizete Píton, “bastaria uma lei do Legislativo, uma medida provisória do Executivo ou uma súmula do Judiciário”.
Algumas decisões do STJ já classificam as instituições financeiras como prestadoras de serviços em operações creditícias para consumidores finais, especialmente em situações de descumprimento do CDC. O ministro Barros Monteiro, atualmente aposentado, afirmou, por exemplo, que, apesar de os juros serem regulamentados por lei complementar, o CDC seria aplicável a instituições financeiras. “Se o empréstimo é tomado por consumidor final, a operação creditícia realizada pelo banco submete-se às disposições do Código, na qualidade de prestador de serviços”, destacou Barros Monteiro.
“Os bancos contam com o fato de que os clientes não conhecem seus direitos e a maioria não procura o Judiciário. Os clientes de bancos não devem ter medo de procurar a Justiça se se sentirem prejudicados”, explica o advogado Rodrigo Daniel, do Ibedec. Com informações da Assessoria de Comunicação do STJ.
Nenhum comentário:
Postar um comentário